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domingo, 19 de dezembro de 2010

Tem muitas histórias do Brasil nas telas de Tarsila do Amaral

Tem muitas histórias do Brasil nas telas de Tarsila do Amaral

O estudo do quadro Operários, de autoria da primeira-dama do modernismo, permite observar como o país ingressou no mundo industrializado, no início do século 20.


Operários: destaque da fase social da pintora, a tela
mostra os vários rostos dos trabalhadores da
recém-inaugurada indústria brasileira.
Foto: Reprodução
O trabalho da pintora passa por várias fases, como a pau-brasil, a antropofágica e a social. Desta última, que contribuiu para solidificar no nosso imaginário o início da industrialização do país, a tela Operários se destaca.

O quadro pintado em 1933 é um verdadeiro painel da nossa gente, a mesma que veio dos quatro cantos do país e do mundo para pegar pesado nas fábricas, que na época começavam a transformar a paisagem brasileira. "Trata-se de um marco histórico na obra de Tarsila, pois, se ela já fora no Brasil a precursora do cubismo e do surrealismo nas artes plásticas, detém-se agora na pintura de assunto eminentemente social", escreve Nádia Battella Gotlib, autora de uma das mais completas biografias da pintora.

Operários funciona como ponto de partida para você falar sobre o surgimento dos grandes centros urbanos brasileiros. Esse é o tema do roteiro indicado para turmas de 5ª a 8ª série que você verá a seguir. Ele contempla as disciplinas de Artes, História e Geografia e foi elaborado por Maria Lúcia Medeiros, professora da Escola Vera Cruz, em São Paulo; Roberto Giansanti, autor de livros didáticos de Geografia; e Marco Antônio Pasqualini, professor de Artes Plásticas da Universidade Federal de Uberlândia (MG). Depois, confira sugestão de atividades de Artes para classes de 1ª a 4ª série.
A nossa revolução industrial
Mostre para a classe a reprodução da tela que ilustra a página ao lado e aborde, inicialmente, a temática social. Pergunte o que os estudantes sabem sobre o funcionamento de uma fábrica e os processos de transformação de matérias-primas. Quais os setores industriais que mais prosperaram no Brasil? Ouça as opiniões e ensine que o conceito de fábrica foi criado pela Revolução Industrial, na Inglaterra do final do século 18. Ele sugere a divisão social do trabalho e a incorporação de novas tecnologias de energia. A indústria, de forma geral, transforma elementos da natureza em objetos fabricados por máquinas operadas pela mão do homem.

Conte à turma que as primeiras fábricas brasileiras dedicavam-se à produção de bens não-duráveis, como tecidos e alimentos. A partir dos anos 1930 e, principalmente depois da Segunda Guerra Mundial, o nosso parque industrial diversificou-se e passou a produzir os chamados bens duráveis automóveis e eletrodomésticos e produtos da indústria de base (cimento, petroquímica e siderurgia).

Instigue a curiosidade da garotada sobre outros aspectos históricos referentes a Operários: aponte os elementos de fundo e os detalhes sobre as figuras humanas. O que sugere o semblante das pessoas? Alguém arrisca dizer qual era a intenção da artista? O que a pintura está anunciando? Há nela alguma denúncia social? (Veja mais informações sobre a industrialização em São Paulo no quadro abaixo.) Hoje, como poderíamos retratar uma cena de trabalhadores?

Anote as hipóteses citadas, escolhendo as principais. Faça os esclarecimentos necessários e proponha uma pesquisa sobre urbanização, industrialização e imigração no início do século 20. Sugira que os alunos elaborem textos sobre o período eles podem ser ilustrados com fotos, gravuras e desenhos relativos à época.

De olho nos elementos visuais da tela
- De início, incentive comentários sobre os aspectos visuais do quadro por meio de algumas questões
- Como os personagens estão organizados?
- Há uma geometria que dá ordem aos elementos?
- Os personagens se agrupam ou são mostrados de forma isolada?
- Quais as cores usadas pela pintora?
- O que são os cilindros verticais no canto superior da tela?
- Que cidade é essa?
- Quem são as pessoas representadas? Elas pertencem a diferentes raças ou classes sociais?

Os estudantes devem perceber que há negros, brancos, japoneses, mestiços, homens, mulheres e crianças de várias idades formando a cena. Ressalte a postura das pessoas: elas estão todas de frente, tendo apenas a cabeça e parte do colo aparecendo. Essa pose sugere padronização e anonimato, apesar dos acessórios individuais. Será que os alunos conseguem distinguir alguém famoso? Mário de Andrade (1893-1945), autor de Macunaíma, é o homem de óculos no meio das pessoas; Oswald de Andrade (1890-1954), o poeta que foi casado com Tarsila, está no canto superior da pintura. Mostre assim que há tanto pessoas humildes, do povo, quanto intelectuais e artistas naquela "multidão" representada.

Conte que Nádia Battella Gotlib aponta em seu livro que os rostos, surreais, levitam, suspensos, tal como o próprio rosto da artista no seu famoso Auto-Retrato. A mensagem, porém, não é mais de beleza radiante. É de miséria e dor. Cada um deles exibe, de modo marcante, a sua própria fisionomia. Algumas delas a artista constrói, inclusive, com base nos traços de pessoas conhecidas. Há força em cada uma dessas expressões que fitam, de frente e corajosamente, o espectador.

É hora de comparar as figuras

Depois dessa análise, teça comentários sobre a formação da pintora e contextualize sua produção. É hora então de aproveitar Operários para trabalhar semelhança e diferença com a garotada de 1ª a 4ª série. O aluno vai fazer composições próprias, no plano ou no espaço, e notar como cada elemento do conjunto possui um caráter especial, individual, único.

Peça às crianças que reúnam objetos variados (latinhas, tampinhas, roupas, canetas, folhas de árvores etc.). Ensine a turma a juntar o que é semelhante, ou seja, constituir uma série, e o que apresenta pequenas alterações (de cor, forma, tamanho, rótulo, características), formando subgrupos. Pergunte o que é igual e o que é diferente em cada grupo. Faça uma reflexão sobre o mundo industrial, a produção em série e a multiplicidade das coisas na natureza e na cultura. As crianças devem criar colagens ou objetos artísticos inspirados em figuras geométricas conhecidas, como triângulos, círculos, ou mesmo estrelas, figuras humanas etc. Observe a forma poligonal de Operários.

Proponha ainda a montagem de um painel com fotos dos alunos e de seus parentes, criando uma discussão sobre a diversidade e a convivência de tipos, comportamentos, características, sexos e raças. Volte a Operários. Procure construir o significado da pintura: a proposta de união e de construção social de vários tipos e classes, em que todos serão os "operários" de uma nova sociedade brasileira. Ajude as crianças a montar uma linha do tempo com as obras da artista, distinguindo o que caracteriza a geométrica fase pau-brasil e a surrealista antropofágica.

                                                  Retrato de uma paulicéia trabalhadora

                                                 

Refinações de Milho Brasil, em 1930:
setor alimentício é uma das pontas da
industrialização em São Paulo.
Foto: Reprodução/ Sommer Andrey


Em 1933, quando Tarsila pintou Operários, São Paulo já havia se consolidado como o principal centro urbano e industrial do país. O acúmulo de riquezas originadas pelos negócios do café, as importações e exportações e a presença de imigrantes possibilitaram o crescimento da cidade.
O desenvolvimento industrial deu-se com a instalação de fábricas de tecidos, alimentos e vestuário. Até 1920, entre 6% e 10% da população morava em cidades. Nos 20 anos seguintes, esse porcentual aumentou para 31%. A maior parte dos trabalhadores que vieram de outros países e de regiões brasileiras chegava em São Paulo. Hoje, mais de 10 milhões de pessoas vivem em pouco mais de 1500 quilômetros quadrados na capital paulista, a maior cidade da América do Sul. 


 O QUE É O MODERNISMO 


Estudar a tela Operários é uma boa oportunidade para despertar a curiosidade da turma sobre o modernismo, movimento estético que sacudiu as artes plásticas, a literatura, a música e outras manifestações artísticas mundiais no final do século 19.
      
                                                                   Fonte: Revista Nova Escola

sábado, 18 de dezembro de 2010

Tarsila do Amaral

TARSILA DO AMARAL

1886-1973


INFÂNCIA E APRENDIZADO

Tarsila do Amaral nasceu em 1 de setembro de 1886, no Município de Capivari, interior do Estado de São Paulo. Filha do fazendeiro José Estanislau do Amaral e de Lydia Dias de Aguiar do Amaral, passou a infância nas fazendas de seu pai. Estudou em São Paulo, no Colégio Sion e depois em Barcelona, na Espanha, onde fez seu primeiro quadro, 'Sagrado Coração de Jesus', 1904. Quando voltou, casou-se com André Teixeira Pinto, com quem teve a única filha, Dulce.
Separaram-se alguns anos depois e então iniciou seus estudos em arte. Começou com escultura, com Zadig, passando a ter aulas de desenho e pintura no ateliê de Pedro Alexandrino em 1918, onde conheceu Anita Malfatti. Em 1920, foi estudar em Paris, na Académie Julien e com Émile Renard. Ficou lá até junho de 1922 e soube da Semana de Arte Moderna (que aconteceu em fevereiro) através das cartas da amiga Anita Malfatti. Quando voltou ao Brasil, Anita a introduziu no grupo modernista e Tarsila começou a namorar o escritor Oswald de Andrade. Formaram o grupo dos cinco: Tarsila, Anita, Oswald, o também escritor Mário de Andrade e Menotti Del Picchia. Agitaram culturalmente São Paulo com reuniões, festas, conferências. Tarsila disse que entrou em contato com a arte moderna em São Paulo, pois antes ela só havia feito estudos acadêmicos. Em dezembro de 22, ela voltou a Paris e Oswald foi encontrá-la.

1923

Neste ano, Tarsila encontrava-se em Paris acompanhada do seu namorado Oswald. Conheceram o poeta franco suíço Blaise Cendrars, que apresentou toda a intelectualidade parisiense para eles. Foi então que ela estudou com o mestre cubista Fernand Léger e pintou em seu ateliê, a tela 'A Negra'. Léger ficou entusiasmado e até chamou os outros alunos para ver o quadro. A figura da Negra tinha muita ligação com sua infância, pois essas negras eram filhas de escravos que tomavam conta das crianças e, algumas vezes, serviam até de amas de leite. Com esta tela, Tarsila entrou para a estória da arte moderna brasileira. A artista estudou também com Lhote e Gleizes, outros mestres cubistas. Cendrars também apresentou a Tarsila pintores como Picasso, escultores como Brancusi, músicos como Stravinsky e Eric Satie. E ficou amiga dos brasileiros que estavam lá, como o compositor Villa Lobos, o pintor Di Cavalcanti, e os mecenas Paulo Prado e Olívia Guedes Penteado.
Tarsila oferecia almoços bem brasileiros em seu ateliê, servindo feijoada e caipirinha. E era convidada para jantares na casa de personalidades da época, como o milionário Rolf de Maré. Além de linda, vestia-se com os melhores costureiros da época, como Poiret e Patou. Em uma homenagem a Santos Dumont, usou uma capa vermelha que foi eternizada por ela no auto-retrato 'Manteau Rouge', de 1923.

PAU BRASIL

Em 1924, Blaise Cendrars veio ao Brasil e um grupo de modernistas passou com ele o Carnaval no Rio de Janeiro e a Semana Santa nas cidades históricas de Minas Gerais. No grupo estavam além de Tarsila, Oswald, Dona Olívia Guedes Penteado, Mário de Andrade, dentre outros. Tarsila disse que foi em Minas que ela viu as cores que gostava desde sua infância, mas que seus mestres diziam que eram caipiras e ela não devia usar em seus quadros. 'Encontei em Minas as cores que adorava em criança. Ensinaram-me depois que eram feias e caipiras. Mas depois vinguei-me da opressão, passando-as para as minhas telas: o azul puríssimo, rosa violáceo, amarelo vivo, verde cantante, ...' E essas cores tornaram-se a marca da sua obra, assim como a temática brasileira, com as paisagens rurais e urbanas do nosso país, além da nossa fauna, flora e folclore. Ela dizia que queria ser a pintora do Brasil. E esta fase da sua obra é chamada de Pau Brasil, e temos quadros maravilhosos como 'Carnaval em Madureira', 'Morro da Favela', 'EFCB', 'O Mamoeiro', 'São Paulo', 'O Pescador', dentre outros.

MORRO DA FAVELA

Em 1926, Tarsila fez sua primeira Exposição individual em Paris, com uma crítica bem favorável. Neste mesmo ano, ela casou-se com Oswald (o pai de Tarsila conseguiu anular em 1925 o primeiro casamento da filha para que ela pudesse se casar com Oswald). Washington Luís, o Presidente do Brasil na época e Júlio Prestes, o Governador de São Paulo na época, foram os padrinhos deles.

ANTROPOFAGIA

Em janeiro de 1928, Tarsila queria dar um presente de aniversário especial ao seu marido, Oswald de Andrade. Pintou o 'Abaporu'. Quando Oswald viu, ficou impressionado e disse que era o melhor quadro que Tarsila já havia feito. Chamou o amigo e escritor Raul Bopp, que também achou o quadro maravilhoso. Eles acharam que parecia uma figura indígena, antropófaga, e Tarsila lembrou-se do dicionário Tupi Guarani de seu pai. Batizou-se o quadro de Abaporu, que significa homem que come carne humana, o antropófago. E Oswald escreveu o Manifesto Antropófago e fundaram o Movimento Antropofágico. A figura do Abaporu simbolizou o Movimento que queria deglutir, engolir, a cultura européia, que era a cultura vigente na época, e transformá-la em algo bem brasileiro.
Outros quadros desta fase Antropofágica são: 'Sol Poente', 'A Lua', 'Cartão Postal', 'O Lago', 'Antropofagia', etc.

ANTROPOFAGIA

Nesta fase ela usou bichos e paisagens imaginárias, além das cores fortes.

ABAPORU

A artista contou que o Abaporu era uma imagem do seu inconsciente, e tinha a ver com as estórias de monstros que comiam gente que as negras contavam para ela em sua infância. Em 1929 Tarsila fez sua primeira Exposição Individual no Brasil, e a crítica dividiu-se, pois ainda muitas pessoas ainda não entendiam sua arte.
Ainda neste ano de 1929, teve a crise da bolsa de Nova Iorque e a crise do café no Brasil, e assim a realidade de Tarsila mudou. Seu pai perdeu muito dinheiro, teve as fazendas hipotecadas e ela teve que trabalhar. Separou-se de Oswald.

SOCIAL E NEO PAU BRASIL

Em 1931, já com um novo namorado, o médico comunista Osório Cesar, Tarsila expôs em Moscou. Ela sensibilizou-se com a causa operária e foi presa por participar de reuniões no Partido Comunista Brasileiro com o namorado. Depois deste episódio, nunca mais se envolveu com política. Em 1933 pintou a tela 'Operários'. Desta fase Social, temos também a tela 'Segunda Classe'. A temática triste da fase social não fazia parte de sua personalidade e durou pouco em sua obra. Ela acabou com o namoro com Osório, e em meados dos anos 30, Tarsila uniu-se com o escritor Luís Martins, mais de vinte anos mais novo que ela. Ela trabalhou como colunista nos Diários Associados por muitos anos, do seu amigo Assis Chateaubriand. Em 1950, ela voltou com a temática do Pau Brasil e pintou quadros como 'Fazenda', 'Paisagem ou Aldeia' e 'Batizado de Macunaíma'. Em 1949, sua única neta Beatriz morreu afogada, tentando salvar uma amiga em um lago em Petrópolis.
PAISAGEM COM TOURO



                                                          O BATIZADO DE MACUNAÍMA

Tarsila participou da I Bienal de São Paulo em 1951, teve sala especial na VII Bienal de São Paulo, e participou da Bienal de Veneza em 1964. Em 1969, a mestra em história da arte e curadora Aracy Amaral realizou a Exposição, 'Tarsila 50 anos de pintura'. Sua filha faleceu antes dela, em 1966.
Tarsila faleceu em janeiro de 1973.

Curiosidades

Tarsila adorava bichos. Ela tinha 40 gatos quando criança na fazenda. Uma delas, uma gatinha branca, chamava-se Falena.
Tarsila ficou amiga de Chico Xavier nos anos 60, depois da morte de sua única filha, Dulce (que morreu em 1966 de diabetes).
Beatriz, a única neta de Tarsila já tinha falecido no final dos anos 40, afogada. Chico Xavier trouxe a ela muita paz espiritual. Eles trocavam muitas cartas e sempre que estava em São Paulo, Chico visitava Tarsila.
Momento de criação I

PAISAGEM COM TOURO - 1925
óleo sobre tela, 50 x 65,2



a) Inicialmente apresente a obra "Paisagem com Touro" aos alunos e faça a leitura formal, "Olhando as obras de arte..."
b) No segundo momento faça com as crianças a leitura interpretativa da obra "Olhando as obras de arte..."
c) Fale sobre a artista Tarsila do Amaral, seu estilo, as cores usadas nas obras, os temas, etc. Mostre outras obras de Tarsila do Amaral.
d) Peça aos alunos que pesquisem o que acontecia no Brasil e no mundo na década em que o quadro foi produzido por Tarsila
e) Converse sobre o modernismo e a antropofagia (peça uma pesquisa sobre esse assunto).
f) Converse com os alunos sobre a vida no campo e a vida na cidade (plantação, produção agrícola, pecuária, qualidade de vida, irrigação, sobrevivência...)
g) Peça que travem um paralelo entre a vida em 1925 e a vida nos dias de hoje.
h) A partir do estudo acima, proponha aos alunos que criem sua própria paisagem, utilizando diferentes materiais expressivos.



Momento de Criação II

Colando papéis


Recortes em jornal com as letras na posição
horizontal, vertical ou inclinada para dar um efeito
visual mais bonito


Inicie a colagem sempre do último plano (céu) para o primeiro plano (touro).
Dê acabamento no topo das montanhas com lápis de cor preto
e as plantas com lápis branco,
Com canetinha preta, dê os acabamentos necessários, boi, plantas, etc.
Faça uma moldura com 3 cm de largura e cole sobre o trabalho.


Momento de Criação III

Recriando a partir do autorretrato de Tarsila do Amaral



A partir da xerox do autorretrato de Tarsila do Amaral, os alunos usarão a criatividade.








A Linguagem Visual

Em Arte, é preciso ensinar a ler textos sem palavras

Para explorar fotografias, pinturas, ilustrações e charges, é preciso saber a gramática própria que rege a linguagem visual e contextualizar as condições de produção de cada obra estudada

Textos não são só aqueles formados por palavras e frases, que se encadeiam para ganhar sentido. Os grafites nas ruas, os comerciais da TV e as pinturas em livros e obras de arte são formados por sinais que precisam ser decodificados, lidos, para serem compreendidos. Somados aos textos verbais, essas linguagens ajudam os alunos a interagir com o mundo e a se expressar melhor.

Mesmo assim, por muito tempo, o ensino de Arte praticamente desconsiderou a necessidade de trabalhar a leitura de imagens e outros gêneros próprios da disciplina, sejam eles visuais, sonoros, corporais e, claro, textuais (leia o quadro abaixo). Ainda hoje, a regra geral de boa parte das escolas é colocar os alunos para produzir sem que eles tenham um conhecimento adequado das obras artísticas. “Com essa ansiedade para pôr a mão na massa, surgem atividades sem nenhuma contextualização”, diz Paola Zordan, professora da Licenciatura em Artes Visuais da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS).

Da multiplicidade de gêneros presentes na disciplina, a leitura de imagens é a mais frequente (leia o infográfico). Fotografias, pinturas, desenhos e charges são expressões artísticas com características próprias, que precisam ser discutidas com a turma para que as obras sejam realmente lidas e não “adivinhadas” – a clássica atividade de mostrar um quadro e mandar, logo de cara, a pergunta “o que o artista quis dizer?” pouco acrescenta ao repertório artístico da turma (leia a sequência didática abaixo).

Em vez disso, você deve procurar auxiliar cada aluno a desenvolver o chamado olhar cultural, em que conhecimentos estéticos, antropológicos, históricos e científicos estão a serviço de uma compreensão da obra de arte que vá além das aparências ou do simples “gostei” ou “não gostei”.

Na prática da sala de aula, a leitura em Arte se dá em cinco etapas principais. A inicial é aquela em que se tem a percepção geral da obra, o resultado do trabalho do artista – é o que os especialistas denominam de aquecimento do olhar. Um mergulho mais profundo é realizado nas três fases seguintes
- descrição (a desconstrução da imagem),
análise (a investigação sobre os meios utilizados)
e interpretação (hipóteses sobre o significado da obra, considerando a vida do artista e as condições em que a obra foi produzida, ou seja, as informações de contexto).
Apenas depois de tudo isso é que o aluno realiza uma nova produção, inspirada pela obra lida – é o momento da releitura (atenção: não se trata de reprodução da obra), que pode ser mais bem desenvolvida com a ajuda de anotações e comentários

Sequência didática:
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Leitura de quadro e produção de comentário

Quadro O Touro, de Tarsila do Amaral.
Foto: Divulgação MAM Salvador

Objetivo
Desenvolver a habilidade de descrever, analisar, interpretar e relacionar imagens.

Conteúdos
- Leitura de imagens.
- Modernismo e surrealismo.
- Relações entre o texto visual e o contexto de produção da imagem.
- Comentário.

Anos 7º ao 9º.

Tempo estimado Seis aulas.

Material necessário
Papel pardo, pincel atômico e cópias coloridas (uma para cada aluno) ou imagem para projeção em telão do quadro O Touro, de Tarsila do Amaral.

Desenvolvimento

1ª etapa Apresente aos alunos a imagem, convidando-os a passear os olhos livremente pelo objeto artístico.
Em seguida, proponha uma conversa, em que eles digam o que mais lhes chamou a atenção na obra, anotando as palavras-chave mais significativas num painel.

2ª etapa  Forme duplas e peça que façam a descrição da obra, anotando no caderno todos os elementos que percebem na figura. Circule pela classe incentivando os alunos a dizer tudo o que estão vendo – o corpo volumoso do touro, os grandes chifres e os olhos que parecem vazios. O animal está de pé, no centro da imagem fitando o leitor, rodeado por formas verticais e volumosas. Socialize os elementos mais importantes no painel, embaixo do título “descrição”.

3ª etapa  Inicie a etapa de análise pedindo que os alunos verifiquem as relações entre os planos. O que será o plano convexo de cores claras? E o plano côncavo, o que representa? E os volumes verticais? Eles precisam descobrir qual é a figura principal da pintura. Qual o significado da imagem do animal? A que tipo de valores ou ideias o touro costuma ser associado? Por que ele foi pintado no centro daquele espaço estranho? Onde ele está? E por que os olhos e o corpo do touro têm aquela forma e aquela cor? Anote novamente as principais contribuições, dessa vez sob o título “análise”.

4ª etapa  Realize um pequeno debate para explorar a interpretação do quadro. Nessa fase, entram em cena emoções, referências pessoais e visões de mundo. Favoreça a conversa lançando algumas questões: que sentimentos a imagem expressa? Que aspectos de sua vida se relacionam a ela? Qual sua opinião sobre a obra? As respostas devem ser consideradas como hipóteses que precisarão ser confrontadas com informações de pesquisas feitas pelos jovens. Uma opção é pedir, por exemplo, que eles comparem suas opiniões com as expressas no texto Dissecando O Touro de Tarsila do Amaral: Possibilidades de Leitura de uma Obra de Arte, de Teresa Cristina Melo da Silveira, disponível na internet no endereço www.seer.ufu.br/index.php/olharesetrilhas/aeticle/view/179/180.

5ª etapa  Amplie o conhecimento da produção artística levando a turma a investigar o contexto de produção da pintura. Citando a artista, a obra e o ano em que ela obra foi produzida – 1928 –, convide todos a entrar no sitetarsiladoamaral.com.br para conhecer outros de seus trabalhos. Passeie pela galeria de produções da artista e leve-os a estabelecer um diálogo entre O Touro e obras como Paisagem com Touro e O Sono, observando semelhanças e diferenças de forma e conteúdo. Em enciclopédias de arte, peça que a turma pesquise sobre o surrealismo e o modernisno, movimentos a que a pintora esteve vinculada, procurando relacionar entre essas vanguardas e a produção de Tarsila.

6ª etapa  Incentive os jovens a criar um objeto cultural que consolide a leitura. Eles podem trabalhar, por exemplo, reconstruindo e ampliando algum fragmento do quadro, construindo imagens baseadas nas várias obras que apareceram durante a leitura ou montando um painel com diferentes figuras de touro destacadas por outros artistas. Organize as produções para que o grupo perceba como a leitura de uma obra possibilita a concepção de trabalhos.

Avaliação
Nas atividades de descrição, análise, interpretação e contextualização, verifique se a turma identifica e registra os principais elementos da obra, a forma como foi realizada, os diálogos que ela trava com outras produções da pintora e de outros artistas na época em que foi feita. Na produção, procure avaliar de que forma a leitura do quadro influi nas novas criações pedindo aos autores um texto explicativo dos trabalhos.
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                      Gêneros privilegiados em Arte 

Imagem -  Realizadas com base em uma gramática característica – a visual –, utilizam formas, cores, volumes e texturas para construir um sentido.

Diferentemente dos textos verbais, que impõem uma forma de leitura – da esquerda para a direita, começando pelas primeiras palavras –, a leitura de uma obra visual é mais subjetiva e requer que o leitor use sua experiência, sua sensibilidade e seus recursos cognitivos para atribuir significados.

Texto verbal  Também presentes em Arte, devem estar, de algum modo, relacionados ao objeto cultural apreciado, já que seu estudo tem como objetivo principal promover a ampliação de repertório da turma e a intertextualidade, trazendo elementos como informações sobre a origem e a intencionalidade do artista. É um terreno fértil para explorar biografias e movimentos, resenhas de exposições, filmes e mostras, catálogos de museus e depoimentos.

Filme  Os que têm como tema a vida e a obra de algum artista também podem contribuir para que a classe compreenda melhor o percurso de criação e o contexto da produção. Atenção, porém, para filmes muito romanceados, que podem acabar mistificando o artista e reforçando rótulos, como o do gênio que cria obras por mágica.
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Descrever, analisar, interpretar

Moça com Livro, de Almeida Júnior.
Foto: Samuel Esteves

Na EMEF Guilherme de Almeida, a turma da 6ª série desenvolve as três etapas de leitura da obra Moça com Livro, de Almeida Júnior (1850-1899)
Interpretação  Hipóteses sobre o significado: a postura da menina remete a uma cena de lazer, seu ar pensativo ao marcar a página do livro pode indicar que ela leu um trecho que a fez devanear

Descrição  Indica o que é perceptível na imagem: a menina está deitada na grama, possivelmente em um parque ou jardim, usa camisa pouco abotoada, tem os olhos voltados para o alto e bochechas ruborizadas

Análise  Diz respeito aos aspectos formais da obra: a pintura é realista, a figura da menina ocupa o primeiro plano e tem cores claras, com exceção das bochechas e lábios, em contraste com o fundo escuro 
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Fonte: Revista Nova Escola

Roteiro para olhar


O pesquisador norte-americano Robert William Ott, da Penn State University, criou o seguinte roteiro para treinar o olhar sobre obras de arte, mas ele pode ser adaptado a atividades ligadas à cultura visual.
O diferencial é fazer sempre a relação com a realidade do aluno:

1) Descrever

Para aproveitar tudo o que uma imagem pode oferecer, os olhos precisam percorrer o objeto de estudo com atenção. Dê um tempo para a obra se "hospedar" no cérebro. Em sala de aula, peça que todos descrevam o que vêem e elaborem um inventário.

2) Analisar

É hora de perceber os detalhes. As perguntas feitas pelo professor devem ter por objetivo estimular o aluno a prestar atenção na linguagem visual, com seus elementos, texturas, dimensões, materiais, suportes e técnicas.

3) Interpretar

Um turbilhão de idéias vai invadir a classe e você precisa estar atento a todas elas, para
aproveitar as diversas possibilidades pedagógicas. Liste-as e eleja com a turma as que
correspondam aos objetivos de ensino. Meninos e meninas devem ter espaço para expressar as próprias interpretações, bem como sentimentos e emoções. Mostre outras manifestações visuais que tratem do mesmo tema e estimule-os a fazer comparações (cores, formas, linhas, organização espacial etc.).

4) Fundamentar

Levantadas as questões que balizarão o trabalho, é tarefa dos estudantes buscar respostas.
Elabore junto com eles uma lista com os aspectos que provocam curiosidade sobre a obra, o autor, o processo de criação, a época etc. Ofereça textos de diversas áreas do conhecimento para pesquisa e indique bibliografia e sites para consulta, selecionando os textos de acordo com os interesses e o nível de conhecimento da classe.

5) Revelar

Com tantas novidades e aprendizados, a turma certamente estará estimulada a produzir.
Discuta com todos como gostariam de expor as idéias que agora têm. Quais são essas idéias e como comunicá-las? É hora criar, desenhar, escrever, fazer esculturas, colagens...